Certa vez, uma psicóloga sem
fronteiras disse em uma entrevista que só era dela aquilo que ela
conseguia levar. Desde que eu saí de casa e mudei de estado penso
nessa frase e sinto certa inveja dessa sensação. Também gostaria
de poder dizer que tudo o que eu tenho de importante cabe
simplesmente em uma mochila.
Nesses meses de adaptação ainda é
difícil se localizar, é trabalhoso montar uma casa nova, escolher
que coisas levar, mas principalmente é doloroso retornar à sua
antiga morada e ver que nada mais está como você deixou. Suas
coisas agora estão encaixotadas, alguém se apossou daquele antigo
armário, sua estante está cheia de pertences de outras pessoas. E
então percebemos que tantas pequenas coisas nos constroem, nos
definem, delimitam a noção que temos de nós.
A gente se confunde um pouco com as
coisas que adquirimos ao longo da vida, desde um guardanapo com um
nome e data, antigos diários, ingressos de cinema, fotos do primeiro
namorado, presentes e suas embalagens... Às vezes, tenho vontade de
pôr tudo o que me pertence em um único lugar. Isso supriria o meu
desejo de olhar em volta e dizer isso é meu, isso conta a minha
história, a isso eu posso recorrer quando a realidade estiver meio
confusa e assim descobrir entre um papel de bombom e um frasco antigo
de perfume a resposta pra alguma questão inquietante.
Tudo isso é o rastro dos passos que
demos para chegar até aqui, como as migalhas de pão em João e
Maria, para que possamos encontrar o caminho de casa. O problema é
que, como na história, tudo é perecível e pode facilmente ser
perdido por um ou outro fator ao longo do caminho. Por hora, sempre
fica aquele livro, aquele cd, aquela foto em uma caixinha a mil e
quinhentos quilômetros de distância.
Daí eu penso o quanto disso tudo
ficou dentro de mim, o quanto dessas lembranças, dessas vivências,
dessas histórias moldaram meus gestos, minha personalidade, meus
ideais de vida, a maneira que conduzo os meus dias. De repente, noto
que tudo ainda continua comigo, também em pequenas caixas dentro do
meu cérebro. Umas mais organizadas, outras nem tanto. Umas com
cadeado, outras de fácil acesso. Em todos os casos, porém, basta um
cheiro, uma cor, um riso, aquela canção, para que tudo venha à
tona e tenha exatamente o mesmo gosto e o melhor, sem precisar pagar
excesso de bagagem.
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